Vamos recapitular, porque de outro modo até custa acreditar que esta história aconteceu mesmo. Primeiro, temos o paiol principal do Exército guardado como nem um galinheiro se guarda contra as raposas, numas instalações de brincadeira e com um sistema de videovigilância que não funcionava, a par de um sistema de rondas que era uma total rebaldaria. E tudo isto com o conhecimento de todos os oficiais responsáveis na cadeia de comando, desde o quartel até ao mais alto gabinete — durante anos. De seguida, e tirando partido das condições existentes, um furriel de Tancos, funcionando como toupeira ou como miserável traidor, passa para fora e para bandidos de delito comum (tráfico de armas e de droga) a informação de que entrar ali dentro e roubar as armas era uma brincadeira de crianças. E assim foi feito, com o maior desplante e sem que, num assomo mínimo de vergonha, toda a hierarquia responsável, até ao chefe de Estado-Maior, se demitisse imediatamente ou fosse imediatamente demitida. Depois, temos uma guerra surda de competências (melhor dizendo, de competição) entre a Polícia Judiciária (PJ) e a Polícia Judiciária Militar (PJM) para saber qual deveria liderar a investigação — conflito resolvido a favor da primeira por decisão da PGR, aliás, a decisão que se impunha. Na sequência disso, ficámos a saber que os mais altos quadros da PJM, um coronel e dois majores, inconformados com o que julgaram ser uma afronta, trataram de mover as suas influências políticas, até ao Presidente da República, para reverterem aquela decisão. E é então que sucede o inimaginável: não conseguindo alcançar os seus fins por esta via, montam uma operação, a meias com a GNR do Algarve (mais dois coronéis e um tenente-coronel envolvidos) e um grupo de delinquentes conhecidos das autoridades, para encenar uma operação de recuperação das armas, após uma hipotética, exaustiva e brilhante investigação própria. Ou seja, negociaram com os bandidos a devolução em segredo das armas roubadas, em troca de esquecerem o roubo. Isto, imaginaram eles, eram dois tiros com uma só bala: lavavam a vergonha do roubo consentido e demonstravam a quem contestava a utilidade da existência de uma PJM a sua superioridade operacional sobre a sua prima civil. E tão contentes ficaram com o seu golpe de mestre que o seu principal artífice, o major Vasco Brazão, da PJM, teve mesmo o desplante de propor superiormente um louvor a todos os militares do Exército e da GNR envolvidos neste vergonhoso embuste. Pois que, como ele escreveu, radiante, ao seu superior hierárquico, “a PJ desta vez não nos passou a perna”. Com meia dúzia de oficiais superiores envolvidos, dá que pensar no estado a que chegou o Exército português.
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2019-09-28 07:11:05Z
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