O Contrato da Legislatura com as instituições de ensino superior para os próximos quatro anos é assinado esta sexta-feira na residência oficial do primeiro-ministro, em Lisboa. O documento prevê um aumento no financiamento em 55 milhões de euros já em 2020.
Este é o segundo “Contrato da Legislatura” assinado entre Governo e instituições do ensino superior. No início da anterior legislatura, foi assinado um documento semelhante, tendo havido problemas na execução e atrasos na entrega de verbas.
Neste documento, destaca-se a iniciativa de criar um regime de acesso diferenciado para os alunos que concluem o ensino secundário pela via profissional. A ideia seria ter as próprias instituições, sobretudo os politécnicos, a criar concursos locais, definindo os critérios de seleção.
Caberia também às instituições operarem mudanças na oferta formativa adequada a estudantes com diferentes currículos escolares.
“Mobilização voluntária”
Este contrato prevê a criação de um projeto-piloto para o qual o Governo está já “em contactos” com alguns estabelecimentos de ensino superior politécnico, nomeadamente do Porto e de Setúbal, segundo confirmou Manuel Heitor à agência Lusa.
"A ideia concreta é não haver uma obrigação, mas uma adesão voluntária das instituições a estes concursos locais. Portanto, tem havido contactos, de Setúbal ao Porto, para haver projetos-piloto, porque [a alteração ao regime de acesso] requer também uma adequação da oferta inicial”, explicou o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Uma vez que as próprias instituições têm de alterar a sua oferta formativa, espera-se neste projeto-piloto a “mobilização voluntária” das instituições de ensino, universidades e politécnicos.
Esta iniciativa vai ao encontro de um dos objetivos do Governo para os próximos quatro anos. O Executivo quer duplicar até 2023 o número de alunos com origem nesta via de ensino a estudar no ensino superior, dos 4.500 atuais para 10 mil alunos em 2023 e 15 mil alunos em 2030.
O contrato hoje assinado prevê ainda um crescimento dos cursos técnicos superiores profissionais (TESP), formações curtas que são uma espécie de “ano zero” de uma licenciatura e que são atualmente uma forma de acesso ao ensino superior por parte dos alunos do ensino profissional.
Bolsas de estudo
No que diz respeito à ação social, o Governo define como objetivo aumentar o número de bolsas de estudo das atuais 78 mil para 90 mil em 2023 e 100 mil em 2030. Mas assume que parte significativa deste financiamento depende do resultado de negociações futuras ao nível comunitário.
"Queremos aumentar o número de bolsas, mas mais do que o número de bolsas as metas estão postas em aumentar a participação no ensino superior. Atingir a meta de 60% até 2030 exige um reforço da ação social escolar. Temos que ir vendo caso a caso, porque essa medida está a ser acompanhada da redução das propinas, que reduz o esforço das famílias, mas também do reforço do alojamento", frisou.
Precisamente no alojamento, o Governo prevê um crescimento de camas das atuais 15.370 para as 26.900 em 2023. Até 2030 espera-se um crescimento mais modesto para as 30 mil camas.
Para além de atrair mais jovens de 20 anos para o ensino superior – passando dos atuais 51 por cento para 55 por cento em 2023, com o objetivo de 60 por cento até 2030, em linha com a média europeia – o Governo pretende ainda duplicar nos próximos quatro anos o número de estudantes estrangeiros no ensino superior. Ou seja, passar dos atuais 58 mil alunos para 116 mil alunos estrangeiros em estabelecimentos nacionais até 2023.
Mais 5.000 cientistas até 2023
Quanto à contratação de investigadores-doutorados, o Governo estabelece a meta ambiciosa de contratar mais 5.000 cientistas na próxima legislatura, e ainda a inclusão de 1.500 na carreira através de concursos regulares.
As restantes contratações estimadas até 2023 serão efetuadas em associação com os projetos de investigação (200) ou pelas unidades de investigação (agregadas ou não a universidades e politécnicos, 400), pelos laboratórios colaborativos (que também têm estatuto próprio, 100) e pelas empresas (500).
Este foi um ponto de fricção entre investigadores, instituições e Governo ao longo dos últimos anos, com várias queixas por parte dos cientistas que denunciaram atrasos nos concursos e resistência das universidades em contratar.
Já as instituições acusaram o Executivo de faltar aos compromissos e alegaram falta de verbas para contratar investigadores.
Incentivos fiscais para as empresas
O ministro revelou ainda que haverá novos incentivos para envolver as empresas nos objetivos de qualificação dos seus trabalhadores. Estes incentivos serão “atualizados nos próximos anos”.
Este incentivo vai ao encontro de outro dos objetivos do Governo, que pretende “empregar melhor com mais e melhor integração entre educação, investigação e inovação e uma respetiva articulação com as empresas, o tecido produtivo e a administração pública".
"A formação de adultos é cada vez mais crítica" num contexto de "acelerada transformação digital" e a necessidade de qualificar a população empregada, explicou o ministro à agência Lusa.
Manuel Heitor antevê dificuldades junto das empresas num tema que é também uma preocupação ao nível da concertação social, mas sublinhou que um dos compromissos assumidos pelas instituições de ensino superior nesta matéria no Contrato de Legislatura é o aumento da oferta em horário pós-laboral.
“Não depende apenas da oferta, mas também, e sobretudo, da relação com os empregadores”, sublinha, referindo que os estudantes universitários portugueses não regressam para formação ao longo da vida.
Para além dos novos mecanismos de ensino à distância, que considera “uma oportunidade para a próxima década”, o ministro pretende ver aumentar a percentagem de diplomados de jovens adultos entre os 30 e os 34 anos.
Universidade dos Açores ausente
O responsável justificou a decisão por discordar do valor de financiamento que seria atribuído à sua instituição, que aumentaria em 700 mil euros a sua dotação inicial. João Luís Gaspar entendeu que o documento o deixava preso a um modelo que o impedia de pedir reforços de financiamento.
Em declarações à Lusa, Manuel Heitor sublinhou que o financiamento definido no contrato resulta de um acordo com o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e com o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), e desvaloriza a ausência da universidade açoriana.
"Naturalmente que todos queremos mais financiamento, mas este aumento global foi aquele que foi possível no contexto não apenas de todas as áreas governativas, mas também daquilo que são as necessidades de aumento do investimento público em Portugal e por isso tem que ser sempre relativizado face à evolução dos outros orçamentos públicos. Portanto, é um bom orçamento para o ensino superior, é um excelente contrato", considerou o governante, em declarações à agência Lusa.
"O reitor tem a sua própria opinião, que se calhar também não é consensual dentro da própria universidade, e ele próprio me informou que não queria assinar o contrato, porque não concordava com a decisão das outras universidades. É um contexto próprio e acho que temos que o respeitar", acrescentou.
c/ Lusa
2019-11-29 10:42:00Z
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