O momento do dia:
Foi um suspense que durou uma hora e meia, elevando as expectativas dos jornalistas que esperavam a conferência de imprensa de Cristas... e estas não saíram defraudadas. Depois do anúncio de uma reunião extraordinária do núcleo duro do CDS e uma espera demorada, Assunção Cristas foi falar aos jornalistas, no largo do Caldas, para anunciar que vai propor nova comissão de inquérito sobre Tancos e pedir a Ferro Rodrigues que envie as declarações de Costa sobre o caso ao Ministério Público. O momento até exigiu que se alterasse a agenda do dia, dotando o anúncio de mais dramatismo.
A frase:
"Não há a nosso ver qualquer conspiração, e se existir alguma é contra o Estado de direito democrático"
Assunção Cristas sobre a tese que circula no PS sobre haver uma conspiração no Ministério Público para tramar o Governo no caso de Tancos.
A personagem:
O regresso de Luís Nobre Guedes já seria de sublinhar por si só, uma vez que o ex-ministro centrista não andava por estas lides há dez anos. Depois de há semanas ter defendido ao Expresso que este é o tempo de o CDS dramatizar e alertar para a situação difícil em que está - estratégia que o partido está de facto a seguir -, subiu ao palco no mega jantar de Aveiro para se juntar aos apelos ao voto. E deixou um recado à líder: "O abraço que der à Assunção [quando sair daqui] quer dizer duas coisas: a solidariedade de todos os que passaram pelo CDS, velhos guerreiros como eu, e a nossa confiança numa geração que não é a nossa mas é melhor que a nossa".
A fotografia:
Se dúvidas houvesse de que o caso de Tancos não só deu ao CDS uma bandeira a que se agarrar como dotou a campanha de nova energia, bastaria assistir ao discurso da líder no jantar da “capital do CDS”, Aveiro. A lista de convidados era longa (João Almeida, Diogo Feio, Luís Nobre Guedes) e seria expectável, como muitas vezes acontece, que o discurso da presidente acabasse por parecer diluir-se relativamente ao dos que foram convocados especialmente para o momento. Mas não foi isso que aconteceu: embalada por Tancos, Cristas cresceu e fez um discurso assertivo, com fortíssimos ataques ao PS e à esquerda e um apelo ao voto intenso.
Durante toda a sua intervenção, Cristas quis colocar-se na posição de oposição - isolada - ao PS. E colocou a questão de uma forma muito mais dramática do que é habitual. “Durante quatro anos, muitas vezes sozinhos, muitas vezes incompreendidos, enfrentámos a arrogância, a ideia muito socialista de que quem se mete com o PS leva e que qualquer crítica ao PS é ilegítima, porque é entendida amplamente como uma crítica ao Estado”, começou.
A prova maior para sustentar a ideia de que o CDS faz oposição, muitas vezes a solo, é agora Tancos. Cristas agarra-se a ela: este sábado, carregou ao máximo e anunciou a proposta para uma nova comissão de inquérito, assim como um pedido para que Ferro Rodrigues envie as declarações de Costa sobre o assunto ao Ministério Público. Não há palavras, defendeu, para “descrever as atitudes deste Governo”, que “continua a não conseguir explicar como é que um ministro podia ter feito uma coisa destas, que um deputado sabe, sem que o próprio primeiro-ministro saiba? Como?”.
Conclusão? “Outros podem ter medo do PS; outros podem preferir o conforto à verdade dos factos. Não temos medo do PS e de dizer a verdade. Há quem nos mande mensagens, que nos diga que isto tem um preço político”, atacou. Uma intimidação não concretizada que diz poder ser aceite por partidos "de linhas ditatoriais como BE e PCP", mas não pelo CDS. E foi ainda mais longe, com a resposta à teoria da conspiração do MP que circula no PS: “Passa a ser tudo uma cabala, mas a verdade é que já vimos este filme e não acabou bem. Não há a nosso ver qualquer conspiração, e se existir alguma é contra o Estado de direito democrático. É contra essa que queremos estar”.
Dados os argumentos, o apelo ao voto. E dos sérios. “Não é tempo de desperdiçar nenhum voto. É tempo de juntar, reunir, tocar a rebate”, quantos sinónimos fossem necessários: é preciso ir votar. Com a mensagem dirigida “a todos os que alguma vez votaram, que se abstêm há muito”, aos que “se põem com votos muito táticos” e dizem preferir uma maioria absoluta do PS do que nova geringonça. “Pode acontecer agora o que aconteceu a muitos em 2015 - quando achavam que era um mero voto de protesto, acordaram com um Governo apoiado pelas esquerdas”, avisou. “Dêem-nos força, não desistam, há muitos votos para conquistar, há muitas pessoas para convencer. Vamos à conquista dos votos, um a um, porta a porta, em todas as ruas”.
Os avisos não poderiam ser mais claros. Até porque, com o caso de Tancos a contagiar toda a campanha, Cristas fez questão de lembrar: “Há muitas eleições que mudam numa semana”.
Não seria o único apelo ao voto: o primeiro chegou logo de início via vídeo, porque Paulo Portas - mandatário por Aveiro nestas eleições - não está em Portugal. Chegou com desejos de boa sorte para Assunção, mas também uma espécie de fasquia: “Que conduza as nossas cores para um bom resultado, melhor do que muitos esperam”. E puxou dos mesmos argumentos para justificar o voto no CDS, pedindo assim a militantes e simpatizantes: “Lembrem às pessoas o que aconteceu em 2015. O que contou não foi a coligação ter ganho ou o partido que teve mais votos, mas a soma dos deputados no Parlamento. Sem a soma dos deputados do CDS, a maioria será de esquerda”.
O culminar dos apelos veio com o regresso de um histórico: Luís Nobre Guedes, ex-ministro centrista que não anda “por estas lides” há dez anos, tomou a palavra para encerrar o jantar e pedir que os “valores de sempre” do partido sejam respeitados - só assim será “um grande partido nacional”. O objetivo deve ser agora o de “voltar a ser o terceiro partido”. Como? “Para isso, o CDS e a presidente vão ter de fazer desta uma semana heróica, em que todos os dias se ganha uma batalha”. Ficou dada a receita, com a garantia da “solidariedade” de um autodenominado “velho guerreiro”.
2019-09-28 23:27:41Z
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