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O Presidente da República reitera nunca ter sido informado, por qualquer meio, sobre o alegado encobrimento na recuperação das armas furtadas de Tancos, e sublinhou que “é bom que fique claro” que “não é criminoso”. “Nem através do Governo, nem através de ninguém no parlamento, nem através das chefias militares, nem através de quaisquer entidades de investigação criminal, civil ou militar, nem através de elementos da minha equipa, da Casa Civil ou da Casa Militar, nem através de terceiros, não tive”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa às televisões, à margem da Assembleia-geral das Nações Unidas, em Nova Iorque.
O chefe de Estado, que é comandante supremo das Forças Armadas, disse que soube que “a defesa de um dos implicados fez questão de afirmar expressamente que não envolvia o Presidente da República”.
Espero que seja a última vez que falo sobre a matéria, até porque se aguarda a todo o momento a acusação, no caso de ela existir, e o que haja a investigar contra quem quer que seja, sem qualquer limitação, seja investigado”, afirmou.
O Presidente sublinhou que se trata dos “mesmos factos, os mesmos elementos”, de “há três ou quatro meses, que são reapresentados”. “Mas para que não restem dúvidas, por uma questão, não só de honra pessoal, mas porque estou aqui a defender a posição de Portugal, é bom que não esteja a defender a posição de Portugal na Assembleia-geral das Nações Unidas ao mesmo tempo que surge uma vaga dúvida sobre se o Presidente é criminoso“.
É bom que fique claro que o Presidente não é criminoso”, frisou.
Marcelo reagiu assim à notícia da TVI, divulgada pouco antes, de que o major da PJ Militar, Vasco Brazão, se referiu, numa escuta telefónica ao “papagaio-mor do reino”, e que, segundo ele, sabia de tudo. O Ministério Público terá interpretado que se referia a Marcelo Rebelo de Sousa, o Presidente da República.
Esta não é a primeira vez que Marcelo Rebelo de Sousa reage a declarações de arguidos do processo que tentam insinuar que ele sabia que havia uma investigação paralela ao furto das armas, por parte da PJM que não ficou contente com o facto de o caso ter ficada nas mãos da PJ civil porque era um crime ocorrido numa instalação militar.
Em abril, também o ex-diretor da Polícia Judiciária Militar (PJM) disse, no parlamento, na comissão parlamentar de inquérito ao caso de Tancos, que pediu ajuda ao Presidente da República quando a investigação foi atribuída à Polícia Judiciária civil. O coronel Luís Vieira afirmou que Marcelo Rebelo de Sousa lhe garantiu que iria falar sobre a sua “preocupação” com a então procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal.
O militar diz que tudo aconteceu a 4 de julho de 2017, dias depois do furto de material de guerra do paiol de Tancos, quando o então ministro da Defesa, Azeredo Lopes, convidou Marcelo a visitar as instalações.
A reunião decorreu na presença de muitos oficiais, o senhor presidente perguntou-me algumas coisas sobre a investigação e eu disse que não estava em condições de responder. Mas que estava preocupado com a decisão da PGR [em atribuir a investigação à PJ]. Ele disse que ia falar com a PGR e ia dizer ao ministro da Defesa para falar com a ministra da Justiça”, declarou.
Quando o deputado do CDS-PP, António Carlos Monteiro, lhe perguntou se tinha consciência que aquele seu pedido violava toda a ordem constitucional e a própria separação de poderes, o ex-responsável pela PJM assumiu o risco. Mas diz que o fez por sentir que houve uma “desconsideração” pela PJM por parte de Joana Marques Vidal ao retirar-lhes a investigação.
Na altura, contactada pelo Observador, fonte da presidência confirmou que no final da visita a Tancos, “o então ministro da Defesa trouxe para junto de si o então diretor da PJM”. No entanto, a versão dos factos é outra: “O Presidente da República disse-lhe que haveria de o receber oportunamente, audiência que acabou por nunca se realizar”, refere, sem responder em concreto ao que o ex-diretor da PJM disse na comissão de inquérito.
O furto de armas de guerra nos paióis de Tancos foi divulgado em 29 de junho de 2017 e, quase três meses após a divulgação do furto das armas, a Polícia Judiciária Militar (PJM) revelou o aparecimento do material, na região da Chamusca, a 20 quilómetros de Tancos, em colaboração com elementos do núcleo de investigação criminal da GNR de Loulé. A forma como o material de guerra — granadas, incluindo antitanque, explosivos de plástico e uma grande quantidade de munições —. apareceu levantou desde logo as suspeitas da PJ civil, que começou a investigar esta operação de recuperação, que acabou na detenção do próprio diretor da PJM e do antigo porta-voz Vasco Brazão. Foram também detidos militares da GNR que compatuaram com a investigação ao desaparecimento de armas, que correu paralelamente à investigação oficial da PJ — a quem o Ministério Público atribuiu a e três militares da GNR, num total de oito militares.
O caso acabou, assim, por ser investigado por duas polícias: a PJ civil, a quem o Ministério Público atribuiu a investigação, e a PJM, que terá mesmo encenado, depois, a recuperação das armas. O processo que agora corre no Ministério Público, e que deverá resultar numa acusação ainda esta semana — caso contrário as medidas de coação aplicadas aos arguidos extinguem-se, tem por isso como arguidos não só os supeitos do furto, mas também os militares da PJM e da GNR que terão encetado a tal investigação considerada ilegal.
Paralelamente, o caso também foi analisado politicamente numa comissão de inquérito. E foi pelas revelações que dali saíram que o então ministro da Defesa, Azeredo Lopes, acabou por ser constituído arguido numa fase posterior. Também o responsável pela Investigação Criminal foi constituído arguido depois de ter explicado perante os deputados como colaborou com a investigação da PJM, quando a investigação era afinal da PJ.
Um dos arguidos do processo é o ex-ministro da Defesa Nacional José Azeredo Lopes, que está proibido de contactar com os outros arguidos, com o seu ex-chefe de gabinete e com o antigo chefe de Estado Maior do Exército, general Rovisco Duarte.
Mas foi o major Brazão quem não poupou ninguém na sua intervenção. O militar assumiu que a investigação paralela teria sido ordenada pelo diretor da PJM, indignado por ter perdido o caso que se passou numa instalação militar para a PJ civil. Brazão disse que, após a recuperação do material de guerra, o diretor da PJM, coronel Luís Vieira, numa diligência, “comunicou ao ministro da Defesa [Azeredo Lopes], na presença do chefe de gabinete, que a operação tinha ocorrido através de um informador”, explicando como tudo tinha acontecido. “O senhor ministro não deu instrução para fazermos de outra maneira”, garantiu.
Azeredo Lopes admitiu que logo no dia em que a PJM anunciou em comunicado a operação de recuperação das armas, que recebeu uma chamada da então Procuradora-Geral, Joana Marques Vidal, a afirmar que poderia avançar com um processo disciplinar contra os responsáveis pela PJM porque tinham feito uma investigação ao arrepio do que o Ministério Público tinha determinado. Pouco depois, o diretor da PJM foi falar com o seu chefe de gabinete, que lhe terá ligado, a informar do que tinha sido feito.
Na comissão de inquérito procurou-se sempre saber qual o nível de conhecimento do caso do ministro da Defesa e do próprio primeiro-ministro, António Costa, que respondeu por escrito aos deputados.
2019-09-25 06:49:02Z
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